7.4.03

Entrevista colada da coluna do Elio Gaspari ontem, no Globo.

Kenneth Maxwell
(62 anos, diretor do programa da América Latina do Council on Foreign Relations, em Nova York.)

Antes do primeiro turno da eleição presidencial o senhor escreveu no The Wall Street Journal e no Financial Times que o melhor negócio para a banca seria a vitória de Lula no primeiro turno. O pessoal do papelório quis queimá-lo vivo. Como o senhor se sente agora, com o risco Brasil abaixo dos mil pontos, o dólar a menos de R$ 3,40 e com os banqueiros encantados com o PT?

Outro dia eu vi um desses encantamentos coletivos. As pessoas que louvavam o governo de Lula eram as mesmas que circulavam no período pré-eleitoral assombradas com a possibilidade de uma vitória do PT. A idéia de que Lula traria o Apocalipse era tola, até utilitária. Fosse qual fosse o vitorioso, a política econômica, no curto prazo, seria parecida com a do governo anterior. Lula não tinha margem de manobra, assim como não há nele uma vocação incendiária. A demonização de Lula vem do tempo da ditadura e se ele tem uma característica, é a de provar que nada tem de demônio. A imprevidência dos analistas é outra coisa. Lembre-se de que o boom dos países emergentes animou Wall Street ao mesmo tempo do boom da internet. Boa parte do pessoal da internet foi trabalhar em restaurantes, mas o pessoal dos emergentes continua fazendo ? e vendendo ? previsões.

O que o senhor acha que vai acontecer com a economia brasileira?

Pelo menos neste ano, Lula deverá fazer tudo para preservar a estabilidade. É preciso ter paciência, porque a situação brasileira ainda é frágil e a situação global sombria. Assegurada a estabilidade, o Brasil precisa ter juros razoáveis. Em pleno século XXI deu-se uma regressão ao XVII, quando os holandeses tomavam dinheiro a 5% em Amsterdã e aplicavam-no em Pernambuco a 60%. Hoje toma-se em Nova York, onde a taxa de juros está a 1,5% ao ano, e aplica-se no Brasil a 26%. É essencial criar um ambiente onde os investimentos sejam redirecionados para os setores produtivos, para a geração de empregos e para o crescimento. O superávit do governo pode ser aplicado no bem-estar do povo brasileiro e não para comprar dinheiro caríssimo.

O senhor não teme que Lula acabe se transformando numa prorrogação do governo de Fernando Henrique Cardoso?

Não. Foi o status quo insustentável do governo passado que criou a vulnerabilidade externa. Lula continua sendo um homem do Brasil real, do Brasil pobre. Não é um estrangeirado. É uma pessoa que conhece a sociedade brasileira de baixo para cima, e não de cima para baixo, uma pessoa modesta. Não é vaidoso, é uma pessoa, apesar de tudo, ainda muito subestimada. Tudo isto ajuda. A pressão para que ele seja a continuação de Cardoso vem dos adversários da mudança que existem dentro da sociedade brasileira. São forças poderosas. Mudar o Brasil não é fácil. Cem dias não são coisa nenhuma. Eu não arriscaria um juízo sobre a presidência de Lula antes de ele completar um ano de governo. É o tempo razoável para que o seu governo passe as turbulências globais de fora e se adapte aos obstáculos burocráticos de dentro. As dificuldades com a burocracia serão maiores do que as dificuldades com o Congresso. Não se deve desprezar os problemas resultantes da inexperiência do próprio PT, mas não devemos desprezar sua capacidade de aprender, nem a do próprio Lula.





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